sábado, 11 de dezembro de 2010
E em três lotes, vendeu o Brasil inteiro.
Noel Rosa, que hoje chega ao centenário
Não se trata de um leilão de privatização, desses que quase liquidaram o patrimônio nacional a preço de banana, na década de 1990. No caso em tela, em 1932, o leiloeiro era um jovem de 22 anos, magricela, com um problema na mandíbula resultado de um parto a fórceps, chamado Noel de Medeiros Rosa. Nesse samba, de resto politicamente incorreto (em tempos em que isso simplesmente inexistia), Noel colocava à venda, em três lotes, uma mulata, um violão e um samba e a partir deles pretendia definir todo o Brasil.
Noel, jovem de classe média do bairro carioca de Vila Isabel, nascido em 11 de dezembro de 1910 e que hoje chega ao centenário, foi um grande inovador da música brasileira. Viveu apenas 26 anos e deixou um verdadeiro tesouro de grandes composições, onde podemos destacar alguns clássicos de nosso cancioneiro, como Feitio de Oração, Feitiço da Vila, Palpite infeliz, Com que roupa?, Conversa de botequim, Não tem tradução, As Pastorinhas, Último desejo, João Ninguém, Três Apitos, entre tantas outras de suas mais de 200 músicas, que encheriam todo o volume desse breve texto e ainda faltaria espaço.
Auto-caricatura de Noel
A inteligência de suas letras, o talento de suas músicas, a felicidade de suas muitas parcerias e a qualidade de seus inúmeros intérpretes trouxe uma fabulosa crônica da vida carioca das décadas de 1920 e 30, com tiradas marcadas pelo mais refinado bom humor e pela observação arguta dos costumes, como em Coisas Nossas, um divertido retrato de sua época. Suas muitas paixões também garantiram algumas das músicas mais marcadas pelos sentimentos, sem render ao estilo piegas que grassa em boa parte da música que costuma a se praticar nos dias que correm.
Álbum triplo gravado por Aracy de Almeida, uma das grandes intérpretes da obra de Noel
Noel Rosa chega jovem e atual ao centenário, além de ser testemunho de um de nossos maiores tesouros: a nossa vasta e diversificada cultura musical. Um país que conseguiu e ainda consegue produzir algo de tal qualidade não precisa apostar na sua própria inviabilidade, no seu fracasso estrutural, como tentaram nos fazer crer os leiloeiros falsos em tempos recentes. Viva Noel.
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